Nuvem do acaso
Quase nada de um pouco de tudo.
Passa para cá uns milhares
Passa para cá uns milhares de euros que eu só faço o que achares que devo. E, aparentemente, assim foi.
Um guarda redes, dois defesas centrais e um lateral de uma equipe de futebol da 1ª divisão foram subornados e alteraram o resultado de um desafio.
Para os apostadores portugueses de nada lhes valeu porque a Stª Casa da Misericórdia, responsável pelas apostas, alertou de imediato as autoridades. Foi há 6 meses. Ouvidos pela polícia judiciária, os quatro jogadores, um deles já numa equipa inglesa, foram constituídos arguidos.
O presidente do sindicato e a equipa onde os quatro presumíveis criminosos jogam já vieram a terreno manifestar espanto, seis meses depois dos factos. O que dizer?
A corrupção alastra neste país não poupando nada e ninguém. Agora foi no futebol, mas foi no governo (como a substituição/resignação de vários Secretários de Estado), nas autarquias (“eles roubam mas fazem” é quase um lema para uma eleição), nas forças armadas (o escândalo dos fornecimentos na manutenção militar que envolveu um oficial general), na justiça (com um procurador constituído arguido), na educação (com textos de exame divulgados por uma professora com particulares responsabilidades), na banca (os exemplos são por demais conhecidos), nas IPSS (a “Raríssimas” é um dos casos), no meio empresarial (poupem-me esclarecer com famosos nomes que na vergonha deveriam ter caído se soubessem o que ela é) e etecetera.
Muito provavelmente há muito mais e que existe onde menos se suspeita. Haverá muito mais para descobrir e só não se sabe mais porque estão quase todos à “manjedoura do Estado” (a recente proposta de lei sobre o financiamento dos partidos políticos é disso reflexo) e só põe a “boca no trombone” quem estiver irremediavelmente entalado. Esprema-se, dê-se a volta ao torniquete, e as vergonhosas verdades virão ao de cima. Mas quem tem espremedores e torniquetes na mão talvez não queira.
O futebol não é a virgem que os seus fanáticos apoiantes querem fazer crer: apito de várias cores, emails com intuitos mais do que duvidosos e agora corrupção de jogadores. Que fazer?
Dar às autoridades de investigação e à Justiça meios humanos e materiais indispensáveis a uma rápida, inflexível e exemplar acção. No caso vertente, caso se prove, expulsar de qualquer competição os presumíveis culpados, cadeia com eles e, em vez de tatuagens de que eles tanto gostam, carimbar de preto as suas caras.
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2017 - Um mini balanço
Em 2017, os vergonhosos acontecimentos que assolaram este país foram diários, semanais, mensais. Corrupção, nepotismo, mentira, roubo, incompetência são alguns dos carimbos na acção política, financeira, económica, empresarial. Claro que em 2017 nem tudo foi reprovável ou criminoso. Houve outros acontecimentos, uns enormemente trágicos e outros bons.
A infernal e dupla tragédia dos incêndios vai marcar tragicamente e durante muito tempo terras e gentes.
Como foi possível esta enorme catástrofe, misto de condições atmosféricas anormais e de impreparação no limite da incompetência de organismos e autoridades que têm como obrigação primeira a segurança do povo e dos seus bens? Houve inquéritos, peritagens e pareceres diversos que deixaram muitas dúvidas e desconfianças.
Os bombeiros voluntários foram de uma dedicação inexcedível e merecem a gratidão de todos.
Depois, o bom, o muito bom. A situação da economia e das finanças que, graças ao novo governo, deu uma volta de 180º, inicialmente muito criticada pelo “reviralho”, com resultados só vistos há mais de quinze anos e nos quais poucos acreditavam. Pelos vistos, a nova política económica da “Geringonça” funcionou para despeito confrangedoramente aparente e pouco louvável da oposição.
Nos “diversos” negativos podem referir-se a banca, os paióis das forças armadas, as tricas parlamentares e futebolísticas, o jantar no Panteão.
Houve ainda outros acontecimentos, também negativos, aos quais só recentemente se deu uma certa relevância. Por exemplo a IPSS “Raríssimas”, na qual um ex-secretário de Estado está alegadamente envolvido; as licenciaturas reivindicadas por responsáveis da protecção civil que se revelaram falsas; elementos da família (pais e irmão) de um ex-secretário de Estado e ex-quadro do BES que não sendo funcionários da empresa receberam 54.000 euros do saco azul daquele grupo através de uma conta offshore; a inacreditável e irresponsável participação financeira (200 milhões de euros) da Misericórdia no Montepio em provável estado de pré-falência.
Dado que a verdade ainda que venha sempre ao de cima leva o seu tempo, julgo que esta procissão ainda vai no adro.
Tudo isto sob o olhar incompetente ou distante das mais variadas governações, supervisões e fiscalizações. Ninguém nos meios político, mediático, desportivo ou empresarial denunciou em devido tempo fosse o que fosse. Nem mesmo o Sr. Presidente, que comenta o tudo e o nada, está a conseguir garantir um são funcionamento das instituições nacionais e parece ignorar que a sociedade sob a sua alta chefia está doente.
A culpa é sempre dos outros, mesmo que estes sejam sempre vizinhos chegados. A culpa morrerá solteira e um “como sempre” não consola.
A estratégia de afectos é confrangedora pela sua total irrelevância social e política. Chegará o tempo em que os “afectos” levantarão sobrolhos e suscitarão sorrisos trocistas. “Afecto”, palavra que deveria ser eleita como a do ano.
Esta sociedade, escandalosamente endogâmica nas esferas do poder político, deveria ser objecto de mais severidade, de mais exigência. Com “afectos” tudo ficará na mesma se não pior. É como na educação das crianças: respeito e uma boa palmada em tempo certo, diálogo ôco e beijinhos é que não.
Então o que se pode fazer e quem é que tem o poder para o fazer? Antigamente, durante séculos havia uma entidade que o tinha: as forças armadas, cuja acção era catalisada e potenciada pelo povo. Hoje, vale rigorosamente zero.
Os portugueses estão de pés e mãos atados. A soberania está entregue a terceiros que de Portugal nada entendem ou pouco sabem. Mas tudo tem o seu preço e escolheu-se, não tão democraticamente como se afirma e se pretende fazer crer, o que hoje se tem e que aflige os que estão atentos e de olhos abertos. A “Europa” há muito que manda em tudo, na moeda, nas finanças, na economia, na agricultura, nas pescas, nas forças armadas. Em tudo, e os portugueses inclinam-se porque, infelizmente, andaram demasiadas vezes de mão estendida.
Isto tem que dar uma volta.
Tem que se aumentar o nível de exigência na família, no trabalho e na escola e alterar radicalmente os métodos de governação da coisa pública. Existe um problema de educação e, também, uma desadequação à realidade do regime político. A actual Constituição já deu o que tinha a dar. O regime parlamentar já não serve e não está, claramente, no ADN do povo português.
Basta analisar os períodos de decadência ou de confusão e os de sucesso, ordem político-social e progresso que Portugal viveu ao longo dos seus 1300 anos de existência. Os primeiros, sob a égide de fracos chefes (“os fracos reis fazem fraca a forte gente”), os segundos sob o primado de uma autoridade central competente e forte. Hoje, o regime parlamentar não passa de um numeroso grupo de personagens, com inúmeras benesses pagas pelo cidadão contribuinte, que periodicamente participam, por vezes sonolentamente, em sessões ordinárias e também em comissões de inquérito das quais nada resulta. É assim que se quer continuar a ir?
Tudo está nas mãos do povo, que só se revolta quando manipulado pelos sindicatos e que nada pode fazer excepto delegar periodicamente o seu poder a anónimos deputados e autarcas que não estão à altura da governação.
Isto tem que dar uma volta mas, no estado em que as coisas estão, só com uma revolução que ninguém quer, excepto, claro, se for democrática o que não se vê como.
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Umas valentes palmadas
Frequentemente, insisto com outros (que comigo concordam) que existe uma enorme diferença entre instrução e educação. O desabafo que se segue vem a propósito dos pequenos escândalos que recentemente assolaram este país, nomeadamente a invocação de falsas licenciaturas por responsáveis de órgãos de protecção civil e a denúncia de gestão danosa em instituições de solidariedade social.
O que distingue o ensino, a instrução da educação?
Ensino é a transmissão de conhecimentos, por exemplo de matemática, português, história, geografia, línguas, ciências, etc.
Educação é incutir o bé-á-ba de uma relação social (bom dia, boa tarde, obrigado, desculpe, se faz favor…) e de comportamentos (ser pontual, respeitar os outros, ser-se arrumado, não deitar lixo para o chão, não mentir, ser solidário, ser honesto…).
Por estes meros exemplos vê-se que existe entre os dois conceitos uma grande diferença. Pode haver, e há, crânios muitíssimo instruídos mas que não passam de gente mal educada, tal como há outros muito pouco qualificados e que no dia-a-dia se comportam como senhores.
Há uma barreira, uma distinção, entre o que a academia dá e o que a escola, a família, os amigos, a sociedade no seu todo, ensinam como comportamento. De um lado, tem-se o vinte em saber e umas poeiras em comportamento e, do outro, têm-se umas migalhas de conhecimento e o que deveria ser uma esforçada acção educativa sobre o saber estar-se em sociedade.
Como mera prova, percorra-se um supermercado, frequente-se um restaurante, procure-se o bem estar de uma praia e assista-se às gritadas e desordenadas birras das criancinhas sob o olhar complacente ou distante dos pais, quando não embevecido.
Claro que nem tudo é preto ou branco, há, como sempre, uma nuvem de cinzento na qual, infelizmente, a realidade de hoje só difícil ou raramente se descortina.
A sinistralidade rodoviária, a pequena criminalidade, as disputas públicas, a gestão danosa para proveito próprio e a imbecilidade e a iliteracia mediática reduzir-se-iam drasticamente com uns gramas de educação. Mas não, é vê-los, ouvi-los, inchados com a importância conferida pelos graus de conhecimento e pelo poder que outros lhe deram.
Licenciado, mestre, doutor e qualquer outro grau (mesmo em instituições de aviário) é mais do que necessário mas é pouco. Fundamental é ser-se o que nunca se sonhou ser-se na escala de uma sociedade sã e, também, o poder praticar-se impunemente a golpada, a mentira, a prepotência para com terceiros, mesmo que tal tenha como preço o desrespeito por si próprio.
Poder é o que importa (em geral muito bem pago, em numerário ou em prepotência ou retribuído, em troca de cadeiras ou de favores). Poder, nem que este seja conquistado por uma sucessão de acasos de diversa origem, tais como o nepotismo puro ou partidário (tu és meu logo és dos nossos), a negociata (toma lá isto e não te esqueças para o que vier no futuro), a falta de vergonha (juro, desconheço totalmente, é uma cabala, etc.).
O importante para os coitados que nos governam ou que ensinam as crianças é a preocupação de se estar na média europeia da literacia e a embevecida análise de se ter abandonado os maus números estatísticos herdados do anterior regime. É claro que isto foi importante, mas foi um salto quantitativo que sendo de saudar afastou dramaticamente a juventude da “boa educação” a qual, quer se goste ou não, pautava o “antigamente”, o qual, aliás, existirá sempre.
Esta juventude tem já ou terá amanhã a responsabilidade de garantia de uma boa educação da sociedade em que se insere tendo em atenção a sua qualidade de futuros educadores como pais, professores, chefes.
Mas não, basta ver, por exemplo, as manifestações de professores os quais, pelo seu comportamento grosseiro e vociferante, são tudo menos exemplo aos jovens que instruem, bem ou mal. Por outro lado, os pais e avós sofrem de uma benevolência míope, de um total alheamento perante as birras das suas adoráveis e mal educadas criancinhas. Antes poderia haver uma instrução limitada para uma muito grande faixa da população e a instrução nos graus superiores era reservada a uns poucos sendo, no entanto, exigentíssima (contrariamente ao que hoje sucede) e não ficando nada a dever à prática das melhores academias europeias.
Havia, sobretudo e nos dois casos, o respeito pelo outro, respeito esse que se incutia desde pequenino e era transmitido de pais para filhos numa sociedade que na sua generalidade era bem educada. Hoje? As falcatruas financeiras, os escândalos futebolísticos, a gestão danosa, os lamentáveis galhardetes parlamentares, os passa-culpas políticos, as licenciaturas de aviário,... Na generalidade, gente sem vergonha e que deveria, se ainda fosse tempo, levar frequentemente umas valentes palmadas.