Nuvem do acaso
Quase nada de um pouco de tudo.
O Chiado e a Basílica da Estrela
O Chiado ardeu há 25 anos. Observei incrédulo e chocado o início do terrível incêndio do Miradouro da Graça. Eu e colegas mais novos que para lá arrastei. Regressei ao trabalho apreensivo. No final do dia a extensão do incêndio ultrapassava em muito o edifício do Grandela, onde começara. Foram destruídos dezoito edifícios e registaram-se, para além de desalojados, dois mortos e dezenas de feridos.
A Basílica da Estrela teve as suas obras concluídas em Setembro de 1790, há 223 anos, quase 200 anos antes do grande incêndio. As madeiras que serviram nos andaimes da obra da Basílica eram tantas que quase chegaram para fazer as casas que abrangem o quarteirão do Chiado do lado sul, entre as ruas Ivens (antiga R. de S. Francisco) e Nova do Almada.
“Em 1760, a princesa herdeira D. Maria Francisca, futura rainha D. Maria I, fez um voto no dia do seu casamento de que no caso de ter um filho varão procederia à construção de um convento para as religiosas Carmelitas Descalças. Em 1777, após a morte de D. José I, D. Maria I escolheu o local conhecido por Casal da Estrela, propriedade da Casa do Infantado, para a construção da basílica (…)”.
A Basílica da Estrela é onde se encontra, no transepto direito, o túmulo de D. Maria I, a qual faleceu no Brasil. É a única rainha da dinastia de Bragança que não está sepultada no Mosteiro de São Vicente de Fora.
(http://www.guiadacidade.pt/pt/poi-basilica-da-estrela-14016).
“...Introduziu D. Maria I nestes reinos o instituto das religiosas da Visitação, de que tinham sido fundadores S. Francisco de Sales e Santa Joana Francisca, e fundou no Largo da Estrela, em Lisboa, o Convento de Freiras Carmelitas Descalças de Santa Teresa, com invocação do Santíssimo Coração de Jesus.
A basílica do Coração de Jesus foi começada em 24 de Outubro de 1779, foi concluída em 15 de Novembro de 1790 e custou mais de seis milhões de réis (seis contos). Dirigiu a obra o major Mateus Vicente e depois Reinaldo Manuel. A escultura interior e relevo da frontaria é de Joaquim Machado de Castro. Superintendeu na administração geral das obras Anselmo José da Cruz Sobral. (...) a instalação (do convento) fez-se a 16 de Fevereiro de 1781, entrando dezasseis freiras, assistindo a rainha e família real à grande festa que houve, terminando por um jantar das religiosas servido pelas pessoas reais”.
(in “Raínhas de Portugal” de Francisco da Fonseca Benevides, 1878).
O filho tão desejado por D. Maria, D. José, nasceu no Palácio da Ajuda a 20 de Agosto de 1761 e faleceu aos vinte e sete anos de varíola, em Lisboa. A sua morte contribuiu para a loucura da sua mãe a Rainha. Foi o primeiro a ter o título de Príncipe da Beira o qual lhe foi dado pelo seu avô o rei D. José I. O seu corpo encontra-se sepultado em S. Vicente de Fora. O seu irmão D. João tornou-se o herdeiro da coroa e, mais tarde, rei de Portugal, com o nome de João VI de Portugal.
O título de Principe da Beira foi criado em 1734 por D. João V. Era destinado ao filho mais velho do rei e presuntivo herdeiro da coroa. Até essa data, o príncipe herdeiro tinha o título de Príncipe do Brasil sendo o de Príncipe da Beira atribuído ao seu filho ou filha mais velha, isto é, ao segundo na linha da sucessão. A primeira Princesa da Beira foi a neta de D. João V, D. Maria Francisca, a futura rainha D. Maria I.
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Curvas e coisas chatas
“Ay qué trabajo me cuesta quererte como te quiero! Por tu amor me duele el aire, el corazón y el sombrero.“
F. G. Lorca.
Intróito: regressei de férias...na praia...exactamente, na praia. Que me desculpem qualquer coisinha no que se segue.
Lembro-me dos olhares reprovadores, dos mais cerimoniosos, e das críticas e conselhos, dos mais íntimos, quando em mim se manifestavam, com toda a clareza, os meus calmos, caseiros e (no entendimento deles) chatos gostos.
Sim é verdade, gostava e gosto de coisas que a divertida sociedade considera chatas.
Com excepção, claro, de alguns femininos atributos (o pudor e a timidez impedem-me de aqui especificar) alguns dos quais uma ânsia de ostensiva aparência quer para sempre cheios, firmes e redondos (porquê esféricos?).
A cirurgia plástica resolveu hoje o problema e é vê-las orgulhosas de inabaláveis, nutridas e estáticas plataformas, que assim ficam até com o simples andar. Fim dos doces bamboleios, indiscutíveis instrumentos da humana luxúria mas, também, insubstituíveis fontes de inspiração dos melhores e mais afoitos poetas. E o orgulho delas e a gula de alguns deles ficam por aqui, coitados.
E os olhos? Espelhos da alma e sinais mudos de desafios?
E a boca, na sua oferta, no seu sorriso, no seu amuo?
E a curva da anca? E a do busto? E a do pescoço?
E umas lindas mãos?
Tudo na mulher é melhor. Tudo menos, claro, o que não é.
(Fotos tiradas da "net" exemplificativas daquela excepção. As minhas - e fui um muito razoável fotógrafo - saíram desfocadas e, sobretudo, tremidas. Espero que tenha sido pela emoção e não pelas maleitas da idade).
Sim sim, gosto perdidamente da mulher, do seu olhar, do seu gesto, do seu sorriso, da sua curva, de tudo o que no corpo ela é. O maravilhoso corpo da mulher, a sua promessa, a sua tentadora promessa, será coisa chata?
No entanto, há coisas que ainda mais desejo, que eternamente ficam e que, essas então, não compreendo que outros possam considerar chatas. Um olhar brilhante e verdadeiro, um gesto reconfortante e solidário, um sorriso cúmplice e amoroso e, acima de tudo, a ternura, a maravilhosa, a incomparável e única ternura da mulher.
Mas não o contesto, para escândalo e escondida reprovação de todos, também gosto (olhem que maçada) de coisas que eles dizem chatas: da família, da minha casa, dos livros, da música, do trabalho, de poucos mas verdadeiros amigos (da divertida sociedade não). Meu Deus, como é que se pode ser tão chato, tão chato, meu Deus?
E por esta razão imagine-se, disseram-me, não fui convidado para uma viagem à China. Logo à China, mundo de gentes ainda imunes às distracções desta nossa triste divertida sociedade e com mulheres frágeis, graciosas e ainda donas (até quando?) de naturais e vivas formas.
Pois é, aparentemente e para minha surpresa, mesmo para os melhores amigos sou um chato, mas sinto-me bem assim. É a conclusão, definitivamente é a conclusão a que cheguei: gosto mesmo daquelas coisas que eles dizem chatas. Poderá ser triste e mesmo chato para outros, mas sinto que são óptimas para mim, para os meus e para a minha vida.
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Comité de sábios
Pela voz do génio precoce ministro Poiares Maduro, o Governo anunciou a criação de um “comité de sábios”. Não é uma comissão mas são sábios. Doze sábios e três sábias (onde está a paridade?).
Neles, identificam-se dois “independentes” próximos da área do PSD que tem cinco, sete são próximos do PS e um do CDS. Oito são das económicas/finanças, três são juristas, dois são engenheiros académicos, um é sociólogo e um é licenciado em geografia. Dois dos sábios têm pouco mais de 40 anos.
Qual a razão desta peregrina ideia de um “comité de sábios”? Para a criação de um novo vocábulo "politicocomunicacional"? Para lavar as mãos na distribuição da riqueza que aí vem? Para provar uma “transparência” na gestão do dinheiro que a Europa nos irá dar? Porquê?
E qual a missão deste “comité”? Segundo o Governo, entre outras, definir uma “arquitectura de programação”, um “verdadeiro processo concorrencial na definição de prioridades” e “instrumentos públicos a privilegiar”. Frases sonantes, quase próprias da cabala, e (atenção à matéria) relacionadas com a gestão dos fundos comunitários.
De acordo com o “Quadro de Referência Estratégico Nacional”, Portugal já recebeu 11.932,6 milhões de euros, correspondente a 55, 72% da sua dotação programada para o período 2007-2013 (www.qren.pt/np4/3381.html).
É um total de mais de 21.415 milhões de euros que corresponde, para aquele período de sete anos, a uma verba de cerca de 8,3 milhões de euros por dia e de 3.059 milhões de euros por ano, em média.
Há muito dinheiro que se recebeu e continua a receber-se da Europa. Gastá-lo bem é, naturalmente, o que importa. Mas em Portugal, contrariamente ao que acontece noutros países europeus, são necessários sábios para estudar a questão. Independentes, claro, como foi sublinhado pelo Sr. Poiares Maduro (independentes de quem? porquê o sublinhado? haverá alguém verdadeiramente independente?). Claramente os quinze não o são, bastando para tal consultar as suas biografias. E, já agora, sábios também têm que ser. Claramente também não o são. Longe disso, muito longe disso.
O Governo encontrou quinze, não se sabe com que critério, e baptizou o conjunto com um nome ridículo que só se justifica pelo ridículo da ideia. Mas, no fundo, este Governo o que é para além de trapalhão? É isso.
O que me faz espanto é o convencimento dos magníficos quinze que o são dado que não o contestaram. Eventualmente, limitaram-se a aceitar inclinando modestamente a cabeça. Eles sábios? Há pouquíssimos em Portugal, na Europa e no Mundo. Há, todos os anos, “nóbeis”, mas sábios?
Eles, os 15, não tiveram o mínimo de pudor de se deixarem adjectivar assim. Estão porventura convencidos de uma sua suma e crucial importância. Para eles é triste (a arrogância e a vaidade são, frequentemente, véus para a vergonha). Para o cidadão é a continuação das trapalhices.
Os sábios farão alguma coisa concreta, criteriosa e economicamente eficaz, ou limitar-se-ão a dizer qualquer coisa quando forem chamados à pedra? Ver-se-à, então, se a frase de Platão se aplica.