Nuvem do acaso
Quase nada de um pouco de tudo.
A Ilha do Corvo e a sua estátua equestre
Sinto uma particular fascinação e curiosidade por relatos que são considerados próprios de lendas mas sobre as quais a história levanta fundadas dúvidas, suscitando polémica e não o trocista sorriso do erudito. A história da existência de uma estátua equestre na Ilha do Corvo que teria sido erigida no século XV e hoje desaparecida é um desses casos.
Gaspar Frutuoso (historiador açoriano,1522-1591, que se destacou pela sua obra “Saudades da Terra” que cotém uma pormenorizada descrição dos arquipélagos dos Açores, Madeira e Canárias e, também, referências ao de Cabo Verde, refere no vol.6 da referida obra a existência na Ilha do Corvo de uma misteriosa estátua de um cavaleiro apontando para Oeste.
"...um vulto de um homem de pedra, grande, que estava em pé sobre uma laje ou poio, e na laje estavam esculpidas umas letras, e outros dizem que tinha a mão estendida ao nor-nordeste, ou noroeste, como que apontava para a grande costa da Terra dos Bacalhaus [Terra Nova]; outros dizem que apontava para o sudoeste, como que mostrava as Índias de Castela [Antilhas] e a grande costa da América com dois dedos estendidos e nos mais, que tinha cerrados, estavam uma letras (...) que ninguém sabia ler (...)”.
Também Damião de Góis (1502-1574) na sua “Crónica do Príncipe D. João” escreve, no Cap. IX (“Em que o autor trata de algumas particularidades das Ilhas dos Açores e de uma antigualha que nelas achou”trata de algumas particularidades das Ilhas dos Açores e de uma antigualha que nelas achou”):
“Estão estas ilhas lesteoeste da rocha de Sintra, e são perto de dez(....) Destas ilhas a que mais alto está ao norte é a do Corvo que terá uma légoa de terra(...) os marecantes lhe chamam ilha do Marco porque com ela (por ter uma serra alta) se demarcam (...) No cume desta serra, da parte noreste, se achou uma estátua de pedra posta sobre uma laje, que era um homem em cima de um cavalo em osso, e o homem vestido de uma capa de bedém, sem barrete, com uma mão na crina do cavalo, e o braço direito estendido, e os dedos da mão encolhidos, salvo o dedo segundo, a que os latinos chamam índex, com que apontava contra o poente(...).
Esta imagem, que toda saía maciça da mesma laje, mandou el-rei D.Manuel tirar pelo natural (...) e depois que viu o debuxo, mandou um homem engenhoso (...) que fosse a esta ilha, para (...) tirar aquela antigualha (...)a verdade foi que a quebraram por mau azo; e trouxeram pedaços dela (...); o que tudo esteve na guarda-roupa de el-rei alguns dias, mas o que depois se fez destas coisas, ou onde puseram, eu não o pude saber.(...).
Gavin Menzies (oficial da marinha britânica e que nessa qualidade percorreu as rotas dos navegadores do passado) no seu livro “1421- The Year China Discovered the World” (objecto de muita contestação do mundo científico), descreve as viagens do almirante chinês Zheng-He (ou Cheng-Ho) (1405-1433), as quais, para além da exploração dos oceanos Índico e Pacífico (confirmadas pelos historiadores) teriam incluído o Atlântico Sul e Norte.
Nessas viagens, era costume, segundo Menzies, erigir-se em locais proeminentes uma estátua de um homem a cavalo apontando a direcção da China. “Seria o caso da Ilha do Corvo (...) a primeira que os chineses terão avistado vindos das Américas (...).Os primeiros relatos da chegada dos portugueses em 1430 rezam assim: “ (...) no cume de uma montanha numa ilha a que chamam Corvo...a estátua de um homem montado num cavalo; a sua cabeça está descoberta e é calvo; a mão esquerda está pousada no cavalo e a direita aponta para ocidente. A estátua está firmemente implantada num pedestal de pedra esculpida numa rocha. Na base há inscrições numa escrita que não conseguimos compreender. (Manuel Faria e Sousa, “Epítoma de las Historias Portuguesas, Madrid, 1638).”
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O burlão e os pacóvios
Haveria tantos comentários a fazer sobre talvez a melhor anedota do ano de 2012.
Acontecimento inacreditavel mas paradigmático.
“(...)Artur Baptista da Silva é um ilustre desconhecido para a maioria dos portugueses. Mas não devia ser um ilustre desconhecido para o Governo. Em primeiro lugar, porque coordena a equipa de sete economistas que o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, decidiu criar para estudar o risco geopolítico e social na Europa do Sul como resultado dos programas de ajustamento. E em segundo, porque é ele que ficará encarregado do Observatório Económico e Social das Nações Unidas para a Europa do Sul, a instalar em Portugal a partir de 2013.(...). (Nicolau Santos in "Expresso" de 22.12.12).
As descrições (por exemplo no semanário Sole no diário i) do que se passou e os esclarecimento do semanário Expresso falam por si.
Aqui vão eles.
(em: http://www.acapoeira.com/?pg=8&lng=pt)
“Apresentou-se como coordenador de um centro de estudos das Nações Unidas e foi entrevistado por jornais, rádios e televisões portuguesas, propondo a renegociação da dívida. Mas o dito observatório não existe e ninguém na ONU conhece o suposto «economista» Artur Baptista da Silva, que poderá ser um impostor. A conclusão é da SIC, televisão 'enganada' por Baptista da Silva, à semelhança do Expresso e da TSF, entre outros órgãos que deram grande destaque às declarações do suposto especialista das Nações Unidas. A televisão de Carnaxide afirma que o português foi condenado nos anos 80 por uma burla milionária a uma empresa. O canal contactou ainda várias fontes na ONU, que afirmaram desconhecer tal nome e que apontaram a inexistência do suposto observatório liderado pelo 'académico'. Baptista da Silva tinha feito manchetes ao defender que Portugal estaria «de joelhos dentro de seis meses» se não renegociasse 41% da dívida, declarando ser essa a opinião institucional das Nações Unidas.
Ainda na sexta-feira, o suposto economista tinha sido um dos convidados do Expresso da Meia-Noite, na SIC Notícias. Não há nos sites da ONU qualquer referência ao nome de Baptista da Silva, nem o dito centro de estudos para a Europa do Sul aparece mencionado. Surgem também dúvidas sobre o currículo académico do português, que diz ser doutorado por uma universidade norte-americana e mestre por uma universidade belga. (...)."
http://www.ionline.pt/portugal/falso-coordenador-da-onu-engana-imprensa
“Artur Baptista da Silva, o homem que nos últimos dias deu três entrevistas na qualidade de coordenador do Observatório Económico e Social das Nações Unidas é afinal um farsante. Segundo o i apurou ontem, foi o Ministério dos Negócios Estrangeiros que ao tentar confirmar o relatório que analisava a política de austeridade portuguesa deparou-se com uma fraude: nem o homem trabalha na ONU nem o observatório referido existe.(...)”
http://www.ionline.pt/portugal/falso-coordenador-da-onu-engana-imprensa
“(...)Artur Baptista da Silva, suposto membro do PNUD e supostamente encarregue pela ONU de montar em Portugal um Observatório dos países da Europa do sul em processos de ajustamento (...), (intitulando-se) professor em "Social Economics", na Milton Wisconsin University, nos Estados Unidos da América. (...), realizou conferência no Grémio Literário a 4 de Dezembro tendo sido introduzido pela presidente do American Club, Anne Taylor. Tudo indica que Artur Baptista da Silva não exerce os cargos e as responsabilidades que dizia ocupar e que as declarações que fez não vinculam nem a ONU nem o PNUD. Investigações conduzidas pelo Expresso e por outros órgãos de comunicação social indicam que Artur Baptista da Silva não faz nem nunca fez parte dos quadros de nenhuma daquelas organizações (...). Consultados os sites alusivos aquela universidade constata-se que ela encerrou em 1982."
(Extracto de esclarecimento do semanário Espresso de 24 de Dezembro.)
http://expresso.sapo.pt/o-expresso-e-artur-baptista-da-silva=f775848#ixzz2Fz2GIlMn.
Vide vídeo em: http://videos.sapo.pt/Cn15AIpaqJSJTo9IvDJu.
Simplesmente delicioso.
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O bispo de Roma
“ (...) As primeiras comunidades de fiéis, as ecclesias, não foram nem mais nem menos do que células, como se chamam hoje às comunistas.
Estavam espalhadas em todas as cidades do Império aonde chegara a palavra dos apóstolos.
Na chefia de cada comunidade era colocado um presbítero,... livremente escolhido pela assembleia de fiéis. Para o assistir foram nomeados diáconos e subdiáconos, acólitos, leitores e exorcistas (aos quais se confiava a cura dos epilépticos).
Inicialmente as ecclesias não tinham entre si relações hierárquicas. O presbítero dava conta da sua conduta apenas a Deus e aos fiéis que o tinham eleito, o que garantia uma perfeita democracia mas não se revestia de qualquer forma de organização.
Com a difusão maciça do cristianismo nas províncias do Império, a necessidade de uma verdadeira organização revelou-se essencial. Multiplicando-se as ecclesias em cada cidade, os vários presbíteros acabaram por eleger um epíscopo, um bispo, que lhes coordenaria as acções.
No séc. IV começaram a aparecer os primeiros arcebispos, os metropolitas e os primazes que eram os supervisores dos bispos de uma província. Até que em cinco cidades – Roma, Constantinopla, Antioquia, Jerusalém e Alexandria – foi instalado um patriarca.
Paulo, nas suas cartas, informa que o movimento de Jesus (o termo “cristão” só surgiu mais tarde) era dirigido por três “pilares”: Simão-Pedro, João e Tiago “irmão do Senhor”, ressaltando claramente que este último, que exercia o seu magistério em Jerusalém, constituía a autoridade suprema.
O de Roma chamou-se Papa, mas este título era também usado por muitos outros bispos.
O papa de Roma era apenas o bispo de Roma, eleito, como todos os outros, pelo clero e pelo povo da cidade.
A teoria de que S. Pedro, fundando a primeira ecclesia em Roma, tinha uma primazia começou a desenvolver-se apenas no séc.V. Até então o seu bispo tinha a mesma importância e os mesmos atributos que os das outras quatro sedes patriarcais. Só no Concílio de Calcedónia de 381 o bispo de Roma foi reconhecido, com muitas dificuldades e divergências, primus inter pares.
No séc. VI, a supremacia, que ele já de facto exercia, foi consagrada com o título de Pontífice ou seja sucessor de Pedro, vigário de Cristo e chefe ecuménico da Igreja. (...)“
(notas recolhidas há anos, cuja fonte hoje desconheço).