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Vou ali e já volto

Quarta-feira, 30.09.15
 
 

Há estudos sérios e outros menos sérios sobre as crises matrimoniais, a sua periodicidade (3º ao 6º ano, 6º ao 10º ano, 10º ao 15º ano e e por aí fora), as suas causas , os seus sintomas.

Por exemplo, diz-se que naquele primeiro período começa-se a ver a realidade, no segundo aparecem descontentamentos resultantes de problemas mal resolvidos, no terceiro aparece a frustração.

Claro que são crises matrimoniais, não são crises de governação mas é interessante notar-se que existe uma certa periodicidade (cerca de 5 anos como nas eleições) e que a percepção da realidade (e não da fantasia) é uma espécie de teia que aparece logo no início e que problemas mal resolvidos conduzem no futuro à frustração e, depois, à rotura.

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Vem isto a propósito do “matrimónio” de Portugal com a “Troika”.
O 1º período começou em Maio de 1978 e terminou em Outubro de 1983 (5 anos). O problema não foi resolvido, como a realidade indica, e a Troika regressou em 2011 com a cegueira própria de quem vê os problemas com dezenas de anos de atraso, transmitindo um incómodo sentimento de frustração e impondo roturas que levarão décadas a cicatrizar.
A Troika “saíu” passados 4 anos em 2015, reganhando Portugal a sua soberania (?) como o actual governo não se cansa de repetir. Mas saíu de vez ou “vou ali e já volto”? Em 2016, por exemplo.

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Qual é, de facto, a situação de Portugal hoje?
Uma frase-resumo seria “continuamos muito mal” e qualquer espirro será sintoma de pneumonia. O Governo no entanto ainda hoje afirmou que “o país virou a situação de crise em que vivia” (sic).
A monstruosa dívida (pública e privada) a qual só para o sector público atinge o faraónico número de 230 mil milhões de euros, a fragilidade do sistema financeiro, o fraquíssimo crescimento económico (que em 2015 é estimado pelo Banco de Portugal em 0,9 %), a taxa de desemprego de 12,4 % em Agosto deste ano (fonte do INE), o envelhecimento da população são, entre outros, factores de preocupação que deveriam merecer atenta análise por parte dos decisores políticos.
Que fazer? Como fazer? Estas questões estiveram ausentes da campanha eleitoral, excepto enquanto armas de arremesso (o que classifica a política e os políticos portugueses), assim como os problemas da educação, da saúde, da justiça, das pescas, da agricultura, da desertificação do interior (para a qual o actual governo contribuiu com o encerramento de centros de saúde, tribunais, escolas), a emigração que só em 2014 levou lá para fora 120.000 portugueses e cujo total desde 2011 é da ordem do meio milhão e etecetera.
Mas, proclamam os políticos eleitos e associados, a doença está na “pesada herança do passado” ou na “Troika” ou na “austeridade” ou no “euro”, ou no “governo e na sua política”. Ignoram a doença e não dizem qual a adequada terapia, admitindo-se que a conhecem.
Hoje sabe-se que o Governo chegou a acordo com o Sindicato dos Enfermeiros sobre uma harmonização salarial. O sindicato desconvoca seis greves e o Ministério da Saúde, que com eles esteve sempre em guerra, entra com 11 milhões de euros (dinheiro dos contribuintes).

Ontem ou anteontem, “descobriu-se” que o Ministério das Finanças “sugeriu” à Parvalorem a alteração das imparidades do BPN reduzindo-as em mais de 140 milhões de euros e que efectuou ajustamentos ao orçamento das Estradas de Portugal. Para quê? Para uma redução do défice de 2012. Quando é que estas “minudências” se decidiram ou foram descobertas? Em 2012? Em 2013? Não, esta semana, a cerca de 4 dias do acto eleitoral. Agora...

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Os políticos são pagos com dinheiro dos contribuintes para tratarem dos problemas da população mas, nos tempos de hoje, alguns tratam na prática dos seus assuntos e dos assuntos dos seus.
O eleitor tem medo, tem desconfiança, tem memória curta,. O candidato a eleito quando não mente descaradamente, ameaça veladamente, apaga a memória e demasiadas vezes defende interesses. Uma vergonha para uma democracia.
Soube-se hoje que o FMI encerrou a sua delegação em Lisboa, que virá cá de vez em quando ver como as coisas estão. A CE e o BCE já se foram embora de acordo com um relógio próprio de uma feira. Viva!
Mas eles garantem que continuarão por aí. Vão ali e já voltam.

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publicado por Alea às 17:44

O Presidente Silva e a crise política

Terça-feira, 16.07.13

 


O Sr. Presidente Silva, no seguimento do pedido de demissão de Paulo Portas apresentado na terça-feira dia 2 de Julho e depois de ter recebido oficialmente todos os partidos com assento na Assembleia e as confederações patronais e sindicais e, também provavelmente mas de modo informal e privado, sabe-se lá que outras entidades e personalidades, falou ao País.

Foi no dia 10 de Julho, passados 8 (oito) dias de calendário após a abertura da chamada “crise” (“manifestação fatal de total irresponsabilidade” seria o qualificativo mais adequado).O discurso pode ler-se na íntegra em:http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=3316216&page=-1.

Para um juízo do compromisso de “salvação nacional” proposto, destacam-se as seguintes passagens do discurso:

(…) impõe-se que todos actuem de forma serena e ponderada, avaliando com bom senso e sentido de responsabilidade quais as soluções que, pela sua credibilidade e pela sua consistência, melhor servem o interesse nacional.(…). A solução apresentada pelo Presidente Silva não foi o resultado de ponderação serena, não é sensata, nem é, sobretudo, praticável tendo em atenção o público desacordo entre PS, PSD e CDS quanto à natureza das medidas de austeridade.

(…) os Portugueses puderam ter uma noção do que significa associar uma crise política à crise económica e social que o País atravessa (…). Os portugueses hoje podem hoje afirmar que o Presidente Silva prolongou e agudizou a crise política tendo eliminado qualquer das alternativas que lhe foram apresentadas para a sua superação não contribuindo para uma sua solução rápida como lhe competia.

(…) desde que estes coloquem o interesse nacional acima dos seus próprios interesses (….). O Presidente Silva não colocou o interesse nacional acima da sua vaidade sendo a sua proposta de “compromisso de salvação nacional” um autêntico pagar de contas: entala o PS que lhe foi sempre hostil e dá uma estalada aos ingratos partidos da coligação.

(…) Chegou a hora da responsabilidade dos agentes políticos. As decisões que forem tomadas nos próximos dias irão condicionar o futuro dos Portugueses durante vários anos (…). O Presidente Silva actuou de forma incompetente: no tempo e na forma da solução proposta. Tempo atrasado, solução que não o é por criar novo e maior problema. Provavelmente ocorrerão eleições antecipadas não agora, como a oposição propôs, mas em meados de 2014. Qual a diferença? Nas dificuldades que se perfilam nenhuma, nomeadamente nas que figuram no discurso presidencial. É o adiar da situação.

(…) os Portugueses irão tirar as suas ilações quanto aos agentes políticos (…). O índice de popularidade do Presidente Silva já traduz ilações dos portugueses e a História (em nota de roda-pé) julgá-lo-á como merece.

(…) os Portugueses têm o direito de exigir que os agentes políticos saibam estar à altura desta hora de emergência nacional (…). Os partidos políticos que assinaram o “memorando” não têm estado à altura das dificuldades que o Estado atravessa e a “verdadeira esquerda” navega num mar irrealista. O Presidente, que só olha para o seu umbigo, tem "desactuado" de forma desatrosa. Ninguém esteve ou está à altura dos gravíssimos problemas com que o País se confronta. O Sr. Presidente Silva agiu como um homem de partido e não como um homem de estado.

(…) as forças políticas colocarão o interesse nacional acima dos seus interesses (…). Não é esta a realidade desde há muito tempo e não é por acaso que o cidadão tem tão má opinião dos agentes políticos . “São todos iguais”, como se ouve por todo o lado. O Sr. Presidente Silva não é excepção e deveria sê-la.  

A história pode resumir-se na seguinte sequência:

“remodelação governamental” com a demissão de Victor Gaspar (a qual não constituiu surpresa quer para o PM quer para o Presidente Silva) »»» “crise governamental” com a publicação da carta de Victor Gaspar e o irresponsável pedido de demissão de Paulo Portas (para todos inesperada, incluindo os órgãos do CDS) »»» “gravíssimo impasse político” criado pelas “medidas de salvação nacional” preconizadas pelo Presidente Silva.

Como barómetro desta sequência bastará ler não só as sequentes declarações de responsáveis da CE mas também analisar o seu paralelismo com a evolução das taxas de juro (yelds das OT a 10 Anos: 28 Junho, 6,46%; 4 Julho, 7,27%; 12 Julho 7,51%).

O Sr. Presidente Silva criou um “molho de bróculos” e não só está a extravasar as suas competências constitucionais como está a ser um agente desregulador do “regular funcionamento das instituições”.     

                                                          

Após o seu discurso e no dia do debate do estado da nação na Assembleia, o Sr. Presidente Silva comunicou dar uma semana para a conclusão das conversações entre os três partidos. Uma semana para o quase impossível! Terá eventualmente caído de uma cadeira, o que ninguém sabe com excepção da D. Maria.

                                              

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publicado por Alea às 13:00

Pátria, 1896/2012. A mesma história

Sábado, 05.01.13

 





"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. (...).

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...).

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País. (...).

A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas; Dois partidos (...) sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar…"

Guerra Junqueiro, "Pátria", 1896.

 


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publicado por Alea às 11:25